Ninguém se aproxima de ninguém se não for num murmúrio.

Tu não entendes porque vou e eu não sei explicar-te. Ou talvez tu até entendas e eu até saiba. Seja como for, este é um daqueles tipos de conhecimento, como outros, que concordamos em manter silenciados. Talvez falemos do tempo ou da comida. É melhor assim. Há afectos que só chegam ao seu destino como murmúrios e não há mal nisso. No universo que vai das nossas memórias aos nossos futuros, sempre houve espaço para tudo. O que vem de longe, o que vem do fundo, é sempre um gesto incompleto. Diz-se baixinho como se dizem as orações.

Um dia viste-me naquela limpidez inolvidável dos teus olhos, sete-luas, sete-sóis, sete-vidas, minha gata, e ficou logo ali tudo sabido e a descoberto, a nudez mais frágil e perigosa, essa. Depois disso, mesmo a aprendizagem dos silêncios foi apenas o percorrer dum tempo fácil e feliz. A felicidade sempre foi contigo tão fácil que dói.

É por isso que volto e não falaremos disto, como não falamos de tanta coisa. Por vezes é preciso voltar ao sítio onde esquecemos o coração na esperança de que ainda nos reconheça e, grato e saudoso, regresse ao peito. Até que regresse sozinho e por vontade própria.

1 comentário:

m e b disse...

Parabéns pelos textos...
Julgo que nunca o tinhamos dito, apesar de ouvirmos e lermos.
É muito bom, quando a vizinhança escreve assim!
Continuação.